Revisão da Vida Toda – Tema 1102
A chamada Revisão da Vida Toda tem por objetivo permitir que, no cálculo da
aposentadoria, sejam consideradas todas as contribuições realizadas ao INSS durante
toda a vida contributiva do segurado, inclusive aquelas anteriores a julho de 1994. Essa
possibilidade contraria a regra de transição prevista no artigo 3.º da Lei nº 9.876/1999,
que limitou o período básico de cálculo (PBC) às contribuições vertidas a partir de julho
de 1994, estabelecendo uma transição para os filiados ao sistema antes de 29 de
novembro de 1999.
Com a entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 103/2019 (Reforma da
Previdência), o critério de cálculo foi novamente alterado, passando a considerar 100%
dos salários de contribuição. No entanto, manteve-se a limitação temporal a partir de
julho de 1994, consolidando essa restrição como regra permanente. O principal
argumento favorável à revisão reside na inconstitucionalidade de uma regra de transição
que se revela mais gravosa que a regra permanente, contrariando o próprio objetivo de
proteção da norma transitória. Assim, quando a aplicação da regra geral (sem limitação
temporal) for mais vantajosa ao segurado, deve-se garantir a sua adoção.
A tese encontra respaldo nos princípios constitucionais da isonomia, da proteção social
e da solidariedade intergeracional, na medida em que busca evitar que os segurados
mais antigos sejam penalizados pelas reformas previdenciárias, assumindo sozinhos
seus impactos econômicos.
A justificativa oficial para a imposição do marco temporal de julho de 1994, conforme o
art. 3.º da Lei nº 9.876/1999, está ancorada na estabilidade monetária promovida pelo
Plano Real, com o objetivo de evitar distorções inflacionárias no cálculo dos benefícios.
Contudo, ao desconsiderar contribuições anteriores a essa data, a regra de transição
pode prejudicar segurados que auferiram remunerações mais elevadas no período
anterior, comprometendo o objetivo original da norma, que era proteger os segurados
que já contribuíam sob regras anteriores. Essa exclusão pode reduzir significativamente
a Renda Mensal Inicial (RMI), sobretudo para aqueles cujo pico remuneratório ocorreu
antes da implantação da nova moeda.
É fundamental aplicar o princípio do direito ao melhor benefício, garantindo ao
segurado a possibilidade de optar pela regra mais vantajosa – seja a geral, que
contempla todas as contribuições desde a filiação, seja a de transição.
Jurisprudência do STF sobre a Revisão da Vida Toda (2022–2024):
O Supremo Tribunal Federal (STF) inicialmente reconheceu, em 2022, o direito dos
segurados do INSS de optar pela forma de cálculo mais benéfica, incluindo as
contribuições anteriores a julho de 1994 (Recurso Extraordinário nº 1.276.977 – Tema
1102).
1. Reversão de entendimento – ADIs 2110 e 2111 (21 de março de 2024):
O STF reverteu esse entendimento, decidindo que a regra de transição da Lei nº
9.876/1999, que desconsidera as contribuições anteriores a julho de 1994, é de
aplicação obrigatória, inviabilizando a escolha do cálculo mais vantajoso pelo
segurado.
Efeitos práticos da decisão – 10 de abril de 2024:
O STF modulou os efeitos da nova interpretação, decidindo que os valores já
recebidos por aposentados com decisões judiciais favoráveis até 5 de abril de
2024 não precisarão ser devolvidos, protegendo beneficiários que já vinham
recebendo com base na tese anterior.
Inviabilidade de novos pedidos:
Segurados que não obtiveram decisão judicial definitiva favorável até 5 de abril
de 2024 não poderão mais pleitear a revisão da vida toda, mesmo que tenham
ajuizado a ação antes da alteração de entendimento.
Reafirmação da posição – setembro de 2024:
O STF reiterou que a nova interpretação se aplica inclusive a ações propostas até
21 de março de 2024, desde que ainda não tenham decisão transitada em
julgado, afastando a aplicação da tese em demandas pendentes de julgamento
definitivo.
Modulação de efeitos – Decisão de 10 de junho de 2025
Em sessão plenária realizada em 10 de abril de 2025, o STF decidiu, por unanimidade,
modular os efeitos da decisão que rejeitou a tese da Revisão da Vida Toda. A Corte
acolheu parcialmente os embargos de declaração apresentados pela Confederação
Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos (CNTM), com base na proposta apresentada
pelo Ministro Dias Toffoli.
Principais pontos da modulação:
Irrepetibilidade dos valores recebidos: Aposentados que receberam valores até 5 de abril de 2024 com base em decisões
judiciais favoráveis (ainda que provisórias) não precisarão restituí-los ao erário.
Isenção de custos processuais:
Nos processos ainda em trâmite até 5 de abril de 2024, os segurados ficarão isentos do pagamento de:
Honorários de sucumbência;
Custas processuais;
Despesas com perícia contábil.
Vedação à restituição pelo Estado:
Caso o segurado já tenha efetuado a devolução de valores ou pago despesas
processuais, não haverá ressarcimento por parte da União.
A "Revisão da Vida Toda" foi idealizada como uma medida de correção das distorções
provocadas pela regra de transição aplicada pelo INSS, buscando assegurar justiça no
cálculo dos benefícios previdenciários. No entanto, diante da recente mudança de
entendimento do STF, essa possibilidade foi significativamente restringida.